Ao
traçarmos uma linha do tempo na história da humanidade, um voo, podemos
observá-la, antes de tudo, pela história da arte.
Num breve
resumo do humano a partir da pré-história, dos nômades até a sua
fixação quando foi descoberta a agricultura e a domesticação dos animais; do
homem pré-histórico ao período barroco, vemos a arte como um salto
narrativo transcendental: das pinturas rupestres às pirâmides do Egito, dos
cânones das esculturas gregas ao salto para a ruptura da Idade Média e o seu
retorno no Renascimento. E a quebra do idealismo Grego pela reforma e a
contrarreforma do período Barroco: a substituição do Davi (divino) de
Michelangelo, pelo Davi sombrio (humano) de Caravaggio.
Desses
momentos, desses recortes em que os artistas pararam o caos, congelaram a
transcendência, daquilo que vai para o alto, que atravessa e que faz
ultrapassar o para além da obra de arte para ir de encontro com as divindades
ou o divino, que foi o motor do mundo até o desvio da arte para outra via: a
razão. Pegando carona com o iluminismo francês do século XVIII, a
arte passou a ser ateia, os neoclassicistas passaram a negar Deus, representado
pela igreja, como motor da vida e o homem passa a cultuar o homem, as
formas perfeitas gregas, a perfeição racional, do conhecimento adquirido,
científico. Mas desse para fora, fez insurgir uma outra oposição, do
artista que quis voltar a si mesmo e que encontrou na sua subjetividade uma
outra forma de ver o fora, nem divino nem racional, mas através do
sentimento, seja na explosão pictural de Turner, ou nas angustias de Goya.
Tendo como impulsão o romance, a poesia e a filosofia. Podemos dizer que
um novo tipo de humano nasce a partir da Alemanha, que vai amar mais a obra de
arte que a vida, ou que irá fundi-las ( que vai colocar em prática as tragédias
shakespearianas como Romeu e Julieta e Otelo) , surge então o romântico que de
uma ponta se encontra o homem Wertheriano: que se autodestrói, seja
na doença em decorrência da vida boemia ou no suicídio; e que também
destrói tudo que fica em sua frente: a religião, os sistemas filosóficos, a
moral, a verdade, a razão: nesta outra ponta abrindo o caminho para a modernidade
se encontra Nietzsche.
Há de se
lembrar, que quem criou o ambiente para a base da música ocidental foi Gregório
Magno, ou papa Gregório, estilo musical que nasceu para serviço de rituais da
liturgia católica romana na Idade Média, e que séculos depois, no período
do Barroco protestante, Sebastian Bach faria da música aquilo
que conhecemos como o ápice do belo, outra vez à
serviço da igreja, como foi também o caso do outro compositor, não menos
notável Mozart. Mas é com Beethoven que a música vai tomar o rumo da arte
romântica, o sofrimento pessoal transfigurado em beleza e ao mesmo tempo
destrutivo, pois assim como Goya na pintura, Bethoveen abria espaço para as
destruições que viriam no inicio do século XX.
Assim,
voltando novamente ao inicio, desde o aparecimento do homo sapiens até
quando ele deixou de ser nômade, fundou o espaço, do espaço que se
tornou as cidades, as nações e com a aparição dos artistas e dos sábios, os
valores humanos começaram a ser criados, para a adaptação da espécie. Os poetas
inventaram os deuses, os artistas os personificaram e os políticos os
oficializaram.
Com as invenções do século XX, que mudaria de vez o mundo: o telefone, a
eletricidade, o avião, o automóvel, a fotografia que cria a crise na
arte, que já vinha desde o final do século XIX, o humano que dá
lugar à máquina, o que fazer com a pintura se a fotografia faz o que ela faz?
Surge então as destruições, um renascimento às avessas: a arte clássica dá
lugar as deformidades: o cubismo, o abstracionismo, o fauvismo e termina na
tela branca de Malevich , junto com as guerras e a crise que
vai desencadear a crise do humano que aparecerá a partir da segunda metade
do século XX: a arte se tornando espelho do homem contemporâneo: um mictório
passa a ser o retrato da civilização.
Nietzsche,
talvez seja o precursor do niilismo pós-moderno, não porque sua filosofia
ensina isso, mas que leva a isso. Nietzsche por muitas vezes ensinou que para
destruir era preciso construir, mas o pensador prevendo o inevitável propôs uma
saída para a degenerescência da cultura e do homem: a fuga da praça pública, a
fuga para o si mesmo, junto com a filosofia e a arte do solitário. Os
anos 80 e o inicio dos 90 do século XX foi o resquício da arte plástica, da
música e da filosofia: ainda respiravam os filósofos, os pintores do pós-
guerra, da pós-ditadura, havia ainda uma qualidade musical, seja com
o rock, seja com o pop americano ou no Brasil a MPB: serão produzidos na Europa
ou na América novos Beatles? Novos Rolling Stones? Aparecerá outro James Brown?
Outro Charlie Parker ? Ou no Brasil, um novo Raul Seixas? Tim
Maia? Legião Urbana? Há talentos aqui e ali, mas longe do grande público, e os
utopistas ainda insistem em salvar o povo, o povo que assiste diariamente os
telejornais mentirosos, os reality shows, as novelas repetidas; que ouvem
música não com a alma ou com os ouvidos, mas com outras partes do corpo que são
da cintura pra baixo, um povo que apoia a destruição dos valores e não a
reconstrução. Um povo que chama reacionários de pensadores, espetáculo de arte,
autoajuda de filosofia.
E se há
um período que poderia intitular a nossa época, com a morte da arte, ou dos
grandes artistas e dos grandes escritores, que fez embrutecer o humano, este
deveria chamar-se pós- história, época que os boçais criam,
conceituam.
Não há Jesus que virá numa nuvem, não há salvador, a única salvação é a
salvação pessoal, do artista que coloca a vida, como uma tela ou papel branco à
sua frente, a todo o momento que precisa, e pinta e escreve a sua
história, seja na dor seja no amor!
Marcos Ribeiro Ecce Ars
Imagem: Mãos desenhando, de M.C. Escher
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